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O Rio Purus

Os rios estão presentes por toda a Amazônia e por todos os capítulos do livro “O Rio Comanda Vida”, no qual o blog foi inspirado. Partindo disso, nada mais justo que dedicar uma seção apenas para eles, com ciclos mensais de matérias que irão contar as histórias por trás de cada um e as histórias que eles guardam. E para dar início, o Purus, cujas curvas representam a Amazônia por diversos cantos do mundo.

Imagem: reprodução/Shutterstock

Suas águas são barrentas (rio de água branca) – devido ao alto teor de argila -, calmas e cortam os estados do Amazonas e Acre, além de parte do território peruano. Possui grande atividade pesqueira e agropecuária, e suas margens abrigam grandes reservas naturais, como a Reserva Biológica do Abufari e a Reserva do Desenvolvimento Sustentável, localizadas no Amazonas, e a Floresta Estadual do Chandless – no Acre.

Imagem: site Defensores da Natureza

O Purus nasce nas colinas do Arco Fitzcarrald, no Peru, e entra no Brasil pelo Acre, na cidade de Santa Rosa do Purus, até desaguar no Rio Solimões. É de grande importância para o desenvolvimento interiorano, pois seu curso abastece cidades do Médio e do Baixo Amazonas, com produtos vindos das capitais amazonense e paraense: Manaus e Belém. O Rio Purus possui atracadouros situados nos municípios de Beruri, Tapauá, Arumã, Novo Tapauá, Nova Olinda, Canutama, Lábrea, Porto Luzitânia, Pauiní e Boca do Acre. As viagens entre as capitais e as 21 cidades brasileiras pelas quais ele passa podem durar dias.

Imagens da década de 1960, retiradas do documentário “Viagem à Amazônia – O Rio Purus”, de Líbero Luxardo

O Rio também foi personagem da era do Ciclo da Borracha, chegando até mesmo a ser navegado por Euclides da Cunha, em 1904, em uma expedição de reconhecimento, o que rendeu um livro: “À Margem da História”.

“O que sobremaneira impressiona no Alto Purus, demarcado oficialmente a partir da Boca do Acre, é o espetáculo da terra profundamente trabalhada pelo indefinido e incomensurável esforço dos formadores do rio...” – Euclides da Cunha

O RIO COMANDA A VIDA

Além de todas as suas propriedades naturais, o Purus também guarda histórias, e são algumas delas que vamos acompanhar agora, sob os relatos de pessoas que já passaram por essas águas.

“Como a estrada BR319 era interditada e as passagens de avião eram muito caras, viajei muito pelo rio, no barco Manoel Silva, do seu Beto, com minhas amigas, desde a infância à adolescência. À noite nós deitávamos na área de lazer [do barco] e ficávamos conversando, olhando para o céu estrelado, que era lindo demais. Embaixo tinha a luz do barco, e em cima, a luz da lua e das estrelas. (...) Uma vez [na década de 80] eu e minha irmã Lana estávamos vindo para Manaus, com uma cuidadora, Alexandrina, nos acompanhando. Minha irmã era bem peraltinha e quando o barco estava parado em Canutama, ela acabou caindo da prancha para o rio.” – Elcineide Maia, 42 anos, nasceu e cresceu em Lábrea, às margens do rio Purus, e hoje vive em Manaus.

“Numa determinada área do rio Purus, entre Lábrea e Pauiní, existe uma passagem perigosa, onde o rio é muito raso. Quando os barcos passam por lá,certos comandantes são surpreendidos por uma pessoa que aparece pedindo o leme da embarcação, para conduzi-la devido “a passagem perigosa”, dizendo conhecer bem a área. O comandante então dá o leme e o estranho faz a passagem do barco, do navio. Depois disso, esse estranho some. Várias embarcações já passaram pelas mãos dele. Não se sabe sua identidade, mas o povo comenta que é o fantasma de um comandante de um navio que naufragou nessa área.” – Maria das Neves Maia, de 62 anos, professora de Língua Portuguesa aposentada, filha de escravos da borracha e conhecedora de muitas histórias, nasceu na pequena vila do Irajá, mas logo se mudou para Lábrea, onde formou sua família e vive atualmente.

“No dia 25 de agosto de 1989, eu [com 18 anos] viajava para Belém, num barco que comprava produtos - jacaré, pirarucu, peixe-seco, borracha, castanha, etc. – na beira do rio. Um dia, nós já tínhamos saído de Lábrea, passado por Canutama, foz de Tapauá, e chegamos à cidade de Tapauá. O meu patrão comprou uma grande quantidade de peixe-seco, aproximadamente 17 toneladas, para camuflar o pirarucu para podermos passar pela barreira. Assim como o encontro das águas do Rio Negro com o Solimões, existe o encontro das águas do Rio Purus, que água barrenta, e do Rio Ipixuna, de água preta. O peixe estava no convés e todas as pessoas estavam na popa, e eu, na sala de máquina, verificando se tinha água no porão e esperando o comandante pedir pra desligar o motor – já que nesse tempo o controle do motor não ficava na sala de comando [...]. As pessoas que estavam na frente não podiam andar para um lado e nem para o outro, se não o barco pendia, balançava, aí nessa hora, em vez de pedir para eu parar o motor, o comandante foi fazer uma curva no encontro dessas águas, tipo um cavalo-de-pau, em alta velocidade, e à medida que ele fez isso, todas as 17 toneladas de peixe que estavam no convés, desceram para a lateral do barco, pendendo o barco, e a água começou a entrar. Então um rapaz mandou eu pular no rio porque o barco porque o barco ia afundar, mas eu não tive tempo. Eu vi quando todos pularam, inclusive ele, e eu fiquei preso na sala de máquina, porque boa parte do pirarucu que estava armazenado lá prendeu a porta, e eu não tinha como escapar, mas me apeguei com Deus, fiz minhas orações e pedi a Ele que me desse mais uma oportunidade de vida. A água já estava dando no meu joelho e eu já estava me afogando, quando de repente, ouvi a parede do barco se romper e as 17 toneladas de peixe foram para água, e o pirarucu que estava prendendo a porta saiu, ela abriu e eu, todo ensanguentado porque tinha caído peixe em cima de mim, consegui forças para sair dali e pular na água. Fui nadando no meio do rio Purus, e antes que eu chegasse na margem, as pessoas me viram e foram em uma voadeira me pegar. O barco não afundou. Eles colocaram um motor-bomba (que suga a água de um lugar e joga em outro) e conseguiram levar o barco para beira. Os moradores de Tapauá foram para o rio pegar o peixe seco que afundou e nós seguimos viagem. Chegamos em Belém.” – João Carlos de Menezes, 45 anos, chefe de cozinha, nasceu e cresceu em Lábrea, formou família em Manaus e hoje mora em Pauiní.

Fontes consultadas: Portal do Acre, Portal Amazônia, WWF.

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 O amazônia 360° 

 

O homem e o rio são os dois mais ativos agentes da Geografia humana da Amazônia. O rio enchendo a vida do homem de motivações psicológicas, o rio imprimindo à sociedade rumos e tendências, criando tipos característicos na vida regional.

 

Livro: O Rio Comanda a Vida

 

(TOCANTINS, 1972, p.276)

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